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Mudança no CARF coloca em risco virada de jurisprudência a favor das empresas

Mudança no CARF coloca em risco virada de jurisprudência a favor das empresas

Uma dança das cadeiras no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) colocou em risco um movimento que vinha beneficiando os contribuintes: as viradas de jurisprudência por meio do novo critério de desempate.

Uma dança das cadeiras no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) colocou em risco um movimento que vinha beneficiando os contribuintes: as viradas de jurisprudência por meio do novo critério de desempate. A tensão está na 1ª Turma da Câmara Superior, última instância do órgão, que geralmente abriga as discussões tributárias de mais alto valor. Dez das 12 teses que os contribuintes conseguiram reverter foram impulsionadas pelo conselheiro Caio Cesar Nader Quintella, que, no mês passado, optou por deixar o Carf. Ele atuava há seis anos no conselho como um dos indicados da Confederação Nacional do Comércio (CNC). Nessa dezena de casos, foi o relator do processo ou o redator do voto vencedor. Advogados dizem que a saída do conselheiro abre um “buraco” na turma. E já há efeitos disso.

Uma das teses ganhas por empresas voltou a virar para o lado do Fisco. Trata-se da incidência concomitante de multa isolada e multa de ofício. Essa tese havia sido a primeira que as empresas conseguiram vencer, no Carf, pelo novo critério de desempate. A jurisprudência havia virado em setembro de 2020. Os conselheiros da 1ª Turma da Câmara Superior voltaram a julgar o tema no começo do mês. Desta vez, sem Quintella na composição da turma, o Fisco venceu por maioria de votos. O conselheiro Gustavo Fonseca, que atuou como suplente na sessão de julgamento, votou a favor da cobrança. Foi o único a se posicionar dessa forma entre os representantes dos contribuintes (processo nº 10882.721447/2015-86). O Carf é um órgão paritário. Cada turma tem oito conselheiros: metade é ocupada por auditores fiscais, representantes da Fazenda portanto, e a outra metade composta por profissionais indicados por entidades da sociedade civil para representar os contribuintes. Até abril de 2020, os julgamentos que terminavam em empate eram resolvidos pelo chamado voto de qualidade.

O presidente da turma, sempre um representante da Fazenda, era quem batia o martelo. Depois, com a Lei nº 13.988 – que incluiu o artigo 19-E na Lei nº 10.522, de 2002 – ficou estabelecido que em caso de empate o contribuinte sairá vencedor. Foi essa mudança que impulsionou a virada de jurisprudência (a favor do contribuinte) em casos de histórica divergência entre conselheiros de contribuintes e fazendários. Dentre eles, o que trata sobre a concomitância de multas. A multa de ofício, de 75% sobre o total devido, pode ser aplicada quando o contribuinte deixa de pagar o tributo de forma correta. Já a isolada, de 50%, pode ser cobrada por falta do recolhimento por estimativa. Essa modalidade é direcionada às empresas tributadas pelo regime do lucro real – as que faturam acima de R$ 78 milhões por ano.

O cálculo do Imposto de Renda é feito mês a mês, com base em uma previsão de lucro, e no fim do ano é feito um encontro de contas: se pagou menos durante o ano, completa o valor devido, se pagou mais, fica com saldo para quitar tributos futuros. Em setembro de 2020, quando houve a virada em favor do contribuinte, Quintella foi designado redator do voto vencedor. A relatora era uma conselheira representante da Fazenda. Ela votou a favor da cobrança, foi acompanhada pelos três outros auditores fiscais da turma e ficou vencida por conta da aplicação do novo critério de desempate.

O conselheiro Gustavo Fonseca, que atuou como substituto de Quintella no julgamento de agora – e concordou com a cobrança -, é integrante da 2ª Turma Ordinária, também chamada câmara baixa. Ele participou da sessão na Câmara Superior como suplente. Ainda não há uma definição oficial sobre a vaga. Nos bastidores, o nome de Fonseca aparece entre os mais fortes. Ele está no Carf por indicação da Confederação Nacional do Comércio – assim como foi com Quintella – e é o único que ocupa uma vice-presidência de turma pela entidade. Advogados que acompanham a jurisprudência do Carf dizem que Fonseca não tem um perfil fazendário, mas costuma ser inconstante nos votos. “Casos envolvendo ágio e planejamento tributário, por exemplo, ele vai e vem. Não tem uma posição consolidada. É um perfil diferente do ex-conselheiro Quintella”, diz um profissional. As viradas de jurisprudência na 1ª Turma da Câmara Superior – ocasionadas pelo novo critério de desempate – beneficiaram pelo menos 26 empresas até agora. Juntas, conseguiram cancelar mais de R$ 500 milhões de cobranças originadas em autos de infração. Dentre elas: Unilever, Lojas Americanas, Goodyear, General Motors e Ford. Fonseca foi procurado pelo Valor, por meio da assessoria de imprensa do Carf, para comentar a participação na Câmara Superior e a possibilidade de permanência na vaga, mas não deu retorno até o fechamento da edição. Também procurado pela reportagem, o ex-conselheiro Caio Cesar Nader Quintella, que agora atua na advocacia privada, disse que mudanças de composição são comuns em todas os tribunais. Afirmou que, no Carf, a rotatividade é alta porque os conselheiros não têm as mesmas garantias e remuneração adequada. “Impacta os casos em que há divisão nas posições dos julgadores. Mas todas as decisões são válidas se fundamentadas. Não há uma melhor que a outra”, disse.

Fonte: Valor Econômico

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